domingo, 25 de outubro de 2009

"Teatro é uma paixão"















Emanando uma doce simplicidade, Maria João Luís trespassava, suavemente, as portas do nosso antro do saber. Um olhar gigantesco de cor de copa louca das palmeiras fitou-me, curioso e expectante. Saudamo-nos cordialmente e eu abstraía-me de todas as personagens que vira ao longo dos anos da minha adolescência a saltitar no ecrã televisivo. Aquela mulher, de cabelos curtos cor de mel, olhar de imenso mar de verde e voz salpicada de doçura e vivacidade metamorfoseava-se em realidade.
Pisou o palco mas desta vez para conversar um pouco sobre o seu espírito inquieto e a sua mais recente iniciativa: o Teatro da Terra. O seu rosto transpirava amor ao Teatro. “O palco é um segredo”. Para esta actriz, o teatro era a sua casa, aí poderia dormir “com uma perna a tapar-me durante a noite”. Disse-o com o verde mar do olhar a ser assolado por uma tormenta de recordações emotivas. “O palco é a minha casa…”.Os gestos vigorosos completavam a sua mensagem de incentivo e a voz, a voz lançou-a sem receios sobre todas as cabeças e os ouvidos prescrutantes. Uma voz de contralto, assertiva mas sempre doce, límpida com ausência de rugosidades.
Teatro da Terra.
A mãe, Maria João Luís.
Referiu o facto de ser importante ter ideias mas realçou o facto de ser ainda mais relevante concretizá-las, apesar de todas as barreiras, de toda esta tentativa de esvanecimento cultural que paira sobre o nosso país. Principalmente, apelou à pro-actividade das pessoas, a não se renderem somente a bengalas económicas que tardam a vir. Sublinhou o facto de ser importante frequentar um curso de teatro, mesmo que não se seguissem as pisadas das artes performativas. Esse curso iria servir para desenvolver competências de relacionamento interpessoal, para criar estratégias de relacionamento num grupo de trabalho. As palavras dançavam no ar, estonteando os ouvintes de agrado. Depois, a resposta efusiva de alguns elementos do público, amantes da arte e do espectáculo.
21.30. Noite sem lua.
Teatro do Bolhão, impregnado de um odor húmido da terra misturado com o perfume das vielas que desembocavam na praceta. Por meio de labirintos de pedra e escadas tortuosas, acedíamos ao anfiteatro, onde se iria desenrolar o espectáculo. As essências misteriosas do palco rodeavam a assistência, expectante. Um momento que se deveria, se possível, prolongar no tempo.
Breu. De repente, uma mulher jovem, envergando vestes negras. Um balde e um pano molhado que ia vergastando, violentamente, o soalho e salpicando o público ávido de interacção. Depois o enredo, a música a ilustrá-lo e a simbologia das cores. Uma interpretação muito natural, prenha de espontaneidade, feita somente por mulheres enclausuradas nos preconceitos, liberdades gritadas, abafadas pelo mofo opressivo dos tempos.

Teresa Garcia

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