sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Aos quinze,

Olhares expectantes
Silêncios calados
Convergência de metas
Partilha de histórias
Eloquência de momentos
Imobilizados
Na inexorabilidade
Do tempo.
Vivências de instantes
Raivas contidas
Expelidas
Numa explosão de
Sentidos
E um burilar
Constante
De cada
Essência.

Teresa Garcia

sábado, 31 de outubro de 2009

Gatos de trazer por casa

Vai para aí um grande entusiasmo sobre o novo programa lançado pela SIC durante o período eleitoral. Refiro-me ao “Gato Fedorento – Esmiúça os Sufrágios”. Um reality de humor à imagem dos famosos gatos que nesses tempos de debate escasso e cinzentismo de propostas constituiu aquilo que generalizadamente se apelidou de “lufada de ar fresco”. E foi sem dúvida. Face a mensagens unilaterais que caracterizam as campanhas, a debates padronizados e sobretudo muito pobres em termos de vivacidade e abertura de ideias, as entrevistas que Ricardo Araújo Pereira realizou, romperam de facto com aquele deserto de ideias e pensamento crítico.
Lamento no entanto dizê-lo: O programa “Gato Fedorento – Esmiúça os Sufrágios” prometeu muito mas concretizou pouco, a meu ver. Desde logo um desequilíbrio interno permanente, aliás já presente nos mais recentes Gato Fedorento. A saber, não se compara a genialidade criativa e o potencial humorístico evidenciado pelo Ricardo Araújo Pereira com a medianez dos seus colegas (engraçados aqui e ali!). Nalguns programas as aparições são de tal modo forçadas e sensaboronas que a comparação com outras peças do mesmo programa, ainda torna mais penosa a sua visualização. O humor tem que ser ruptura, radicalidade, mas também bom gosto, “golpe de asa”, inteligência, expressividade. Não pode ser um mero reportório de “sketchs” sem piada de mero suporte à estrela. Mas esta fragilidade não é nova. É a história dos Gatos que tem na sua estrela maior o Ricardo Araújo Pereira cujo talento absolutamente extraordinário o diferencia de todos os outros.
Voltando ao recente programa, o que verdadeiramente causou uma comoção nacional foram as entrevistas que diariamente o programa apresentou com protagonistas da vida política nomeadamente ligados à maratona eleitoral que ocorreu durante os últimos meses. E aí é que eu me permito discordar dos comentários mais ou menos generalizados.
A ideia era: vamos entrevistar políticos da praça, vamos colocar algumas questões com piada ou questões delicadas que um entrevistador “normal” não faria. E este é para mim o pecado original de opção editorial do programa: assume-se logo que a entrevista não é séria (“é para ter piada”) é para rir, é para divertir os telespectadores. Os entrevistados que num primeiro momento poderão ter sentido o desconforto ou o risco de lá irem, rapidamente se aperceberam que aquele era um palco óptimo para mostrarem o seu lado humano, o seu sentido de humor (mesmo que manifestamente não o tenham), para dizerem umas graçolas alinhando numa entrevista que se tornou inócua e nalguns casos sem piada nenhuma. Até a lógica dos convites muito politicamente correcta (todas as figuras do poder, da oposição quer nacional quer regional, independentemente da sua actualidade e do que se previa terem para dizer) reforçou aquilo em que o programa se transformou: um desfile de vaidades de políticos mais ou menos activos ou no activo que na maioria dos casos apenas se limitavam a reagir com mais ou menos graça às interpelações do entrevistador, sempre num registo muito soft e muito “alinhadinho”: “vejam meus amigos como eu sou corajoso vindo cá, como sou engraçado e como tenho sentido de humor”, jamais conferindo ou aceitando o lado sério que muitas das questões efectivamente tinham.
Estou convencido que a partir dos primeiros dois ou três programas, logo que se percebeu que para além de inofensivo, era um palco para dar algum brilho a imagens cinzentas ou mesmo desgastadas, que os políticos da nossa praça e alguns das chamadas personalidades mediáticas, terão mesmo começado a insinuar-se senão mesmo a “meter cunhas” à produção do programa para que fossem convidados para lá ir. Há, aliás, algumas presenças que mais pareceram “fretes à imagem” de determinadas personagens da nossa praça, do que propriamente escolhas alicerçadas em critérios de relevância política, intelectual ou outra.
Salvo as devidas distâncias, um programa como o “Daily Show” (uma das referências do género) alia momentos hilariantes e verdadeiramente radicais com entrevistas sérias, com debate profícuo e com conteúdo sempre fundamentado na actualidade: uma iniciativa política recente, um livro lançado, uma ideia forte amplificada pela comunicação social, etc. Ou seja, exactamente o contrário do que na maior parte dos casos se fez ali: uma “passerelle” muito convencional de “politicozinhos” e personalidadezinhas na ordem do dia, naturalmente muito contentinhas com a visibilidade sem risco que lhes foi concedida.
E por favor não me digam que não é possível à nossa escala dar meios de produção similares a uma equipa como os Gatos. E também estou convencido que o Ricardo Araújo Pereira tem mérito intelectual, capacidade jornalística, sentido crítico e cultura política mais do que suficientes para ser um “pivot” a sério de um programa de humor daquele género com entrevistas acutilantes sobre a actividade política e cultural e sobre o pensamento dos nossos dias.
Agora que terminou, proceda-se pois a um balanço sério: o programa teve mérito indiscutível, rompeu com algum cinzentismo mediático que caracteriza o nosso panorama televisivo na abordagem de questões políticas, teve aqui e ali momentos geniais mas tem um potencial imenso ao nível desse momento âncora que são as entrevistas com personalidades. Potencial que exige uma abordagem criativa, de ruptura com padrões clássicos de abordagem televisiva e de ousadia mediática.
Tenho para mim que o salto qualitativo que o programa deve dar em futuras edições, terá de passar cada vez mais pela utilização ainda mais expressiva e ambiciosa do profissional Ricardo Araújo Pereira, pois como se diz agora, ele estará sempre no lado da solução.
António Pêgo

domingo, 25 de outubro de 2009

"Teatro é uma paixão"















Emanando uma doce simplicidade, Maria João Luís trespassava, suavemente, as portas do nosso antro do saber. Um olhar gigantesco de cor de copa louca das palmeiras fitou-me, curioso e expectante. Saudamo-nos cordialmente e eu abstraía-me de todas as personagens que vira ao longo dos anos da minha adolescência a saltitar no ecrã televisivo. Aquela mulher, de cabelos curtos cor de mel, olhar de imenso mar de verde e voz salpicada de doçura e vivacidade metamorfoseava-se em realidade.
Pisou o palco mas desta vez para conversar um pouco sobre o seu espírito inquieto e a sua mais recente iniciativa: o Teatro da Terra. O seu rosto transpirava amor ao Teatro. “O palco é um segredo”. Para esta actriz, o teatro era a sua casa, aí poderia dormir “com uma perna a tapar-me durante a noite”. Disse-o com o verde mar do olhar a ser assolado por uma tormenta de recordações emotivas. “O palco é a minha casa…”.Os gestos vigorosos completavam a sua mensagem de incentivo e a voz, a voz lançou-a sem receios sobre todas as cabeças e os ouvidos prescrutantes. Uma voz de contralto, assertiva mas sempre doce, límpida com ausência de rugosidades.
Teatro da Terra.
A mãe, Maria João Luís.
Referiu o facto de ser importante ter ideias mas realçou o facto de ser ainda mais relevante concretizá-las, apesar de todas as barreiras, de toda esta tentativa de esvanecimento cultural que paira sobre o nosso país. Principalmente, apelou à pro-actividade das pessoas, a não se renderem somente a bengalas económicas que tardam a vir. Sublinhou o facto de ser importante frequentar um curso de teatro, mesmo que não se seguissem as pisadas das artes performativas. Esse curso iria servir para desenvolver competências de relacionamento interpessoal, para criar estratégias de relacionamento num grupo de trabalho. As palavras dançavam no ar, estonteando os ouvintes de agrado. Depois, a resposta efusiva de alguns elementos do público, amantes da arte e do espectáculo.
21.30. Noite sem lua.
Teatro do Bolhão, impregnado de um odor húmido da terra misturado com o perfume das vielas que desembocavam na praceta. Por meio de labirintos de pedra e escadas tortuosas, acedíamos ao anfiteatro, onde se iria desenrolar o espectáculo. As essências misteriosas do palco rodeavam a assistência, expectante. Um momento que se deveria, se possível, prolongar no tempo.
Breu. De repente, uma mulher jovem, envergando vestes negras. Um balde e um pano molhado que ia vergastando, violentamente, o soalho e salpicando o público ávido de interacção. Depois o enredo, a música a ilustrá-lo e a simbologia das cores. Uma interpretação muito natural, prenha de espontaneidade, feita somente por mulheres enclausuradas nos preconceitos, liberdades gritadas, abafadas pelo mofo opressivo dos tempos.

Teresa Garcia

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Histórias de Vida

Razões profissionais obrigam-me a participar em inúmeros seminários, conferências apresentando oradores mais ou menos conhecidos, individualidades relevantes e sobretudo profissionais das Empresas que apresentam testemunhos, experiências e as suas práticas mais exemplares. São sempre momentos importantes não tanto pelo seu lado mais simbólico e expositivo, mas sobretudo pelo espaço de partilha que propiciam – partilha de experiências, o encontro de visões plurais e de caminhos diversos.
Em boa hora, a AEP no âmbito das suas responsabilidades de promotor de Cursos de Educação e Formação de Adultos convidou o jornalista Júlio Magalhães. Num auditório pleno de atenção, meia dúzia de turmas EFA, ouviram com “atenção interessada” o Homem, o jornalista, o cidadão, o escritor que lhes transmitiu memórias de vida, recordações e vivências marcantes, experiências profissionais decisivas, ilusões e desilusões de uma personalidade cativante, comunicativa, e com uma enorme sensibilidade.
Com uma simplicidade notável Júlio Magalhães alertou consciências, levantou interrogações, percorreu momentos fundadores da sua vida, despertando emoções e recordações numa plateia fascinadamente atenta.
Por razões de natureza pessoal não posso deixar de referir um lugar para o qual Júlio Magalhães habilmente nos transportou.
Refiro-me ao apelo de África – de uma África que já foi e já não é, de uma Angola natal lhe imprimiu algumas das suas memórias mais intensas. Revisitei a minha condição já longínqua de retornado, relembrando com ele pedaços de histórias que se viveram então e que são hoje memória. Fomos transportados com Júlio Magalhães a essa África intensa que nos preenche, que só sente quem já lá esteve e pressente quem lá não esteve.
As memórias que Júlio Magalhães connosco partilhou (de resto como no livro “Os Retornados”) são memórias que transportam a alegria dos bons tempos, de juventude bem vivida, mas também da capacidade de integração na metrópole que “nem a Coca-Cola conhecia”, e de uma experiência de vida feita de acasos felizes associados numa grande persistência e enorme criatividade. Júlio Magalhães tem a arte de nos apresentar uma vida simples mas repleta de histórias divertidas com um enorme sentido comunicativo e sensibilidade.

Por isso estou certo que cada adulto presente naquele auditório, se reviu aqui e ali na notável história de vida de Júlio Magalhães, e com ele reflectiu uns em silêncio e outros através dos testemunhos vertidos neste blogue.


De Djelimady Tounkara - um músico fundador do Blues da África Ocidental, uma música extraordinária: Fanta Bourama.


http://www.youtube.com/watch?v=4E2aaQHcXHw&feature=related

António Pêgo


quinta-feira, 16 de julho de 2009

Os retornados

Tantos anos já passados
Desde que os retornados
Aqui vieram parar.
Mil vidas despedaçadas
Ainda hoje choradas.
Lembranças a recordarem
É assim anualmente.
Quando toda a gente
Procura juntar-se
É o matar de saudades
É o falar de verdades
Que ninguém pode abafar.
É juntar amigos
Recordar perigos
Dos tempos de além-mar
Aqui reina a alegria
Até ao final do dia
Na hora de regressar
Mais um ano afastado
É com os olhos molhados
Que prometemos voltar



HELENA ALMEIDA (EFA G.S.A)



http://www.youtube.com/watch?v=N0II75gCW-c

Reflexões sobre conversa com Júlio Magalhães...




É bom por vezes ter momentos de evasão da realidade dura que nos é mostrada, por exemplo através da televisão. Com a palestra gentilmente feita pelo Júlio Magalhães tive uma visão ainda mais realista, ainda que seja uma visão segundo os seus olhos. É uma realidade muito severa.


Os meios de comunicação não são mais do que “máquinas” a trabalhar no interesse dos grandes grupos económicos, que têm um único objectivo: OS NÚMEROS, O LUCRO, O DINHEIRO. Nem que tudo isto passe pelo choque de certas imagens, notícias em horário estratégico ou simplesmente pela manipulação em relação às crianças, que vai desde os brinquedos aos hábitos alimentares. O próprio jornalista descreveu isso com a simplicidade de quem lá trabalha, sem conseguir “despir a camisola” da empresa que representa. Conseguiu transmitir o verdadeiro stress em que vivem os profissionais da “caixinha mágica” para manipular as marionetas que somos todos nós nas mãos deles. Com muita naturalidade assumiu que noutros países se tivessem de descer as audiências, eles em tempo real alteram a grelha sem aviso prévio e o “burro come a palha que lhe dão”. É triste sermos tidos nesta conta. Se não dermos lucro, não temos opinião. Se não gostarmos de programas “de massa”, que chamam audiências, não temos direito a ver em horário nobre. Mas com tantos anos de trabalho na área é natural que fale desta forma. É a realidade do seu ambiente de trabalho e para o que é pago, provavelmente muito bem pago.


Também achei interessante o facto de Júlio Magalhães ter necessidade de ter actividades extra, sem terem nada em comum com a sua profissão, como jogar basquetebol ou escrever. Penso que é muito útil termos algo que gostemos de fazer para enveredarmos por aí quando abandonarmos a nossa profissão, para não nos sentirmos inválidos ou desorientados por nos faltar a rotina a que estamos presos. Outro ponto que achei muito interessante das suas palavras foi o facto de ele ter reconhecido que na vida foi um privilegiado. Soube aproveitar as oportunidades que a vida lhe deu. É um lema meu também, aproveitar as oportunidades na vida. Dizem que nada é por acaso, não sei se é ou não, mas por via das dúvidas aproveito sempre. Assim não me posso arrepender de lutar para conseguir uma vida melhor. Ele conseguiu, sem sequer ter concluído nenhuma licenciatura, não quer dizer que hoje em dia a realidade seja assim. No entanto, esta Nova Oportunidade vai ser a chave para um futuro melhor, disso tenho a certeza. Não sei se conseguirei ter o sucesso de Júlio Magalhães, mas hei-de ter sucesso na minha área com certeza. Isso posso dizer, pois depende de mim, e o que depende mim eu sou suficientemente exigente comigo própria para querer apenas o melhor!



Liliana Fonseca (EFA G.S.A)

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Júlio Magalhães - A frontalidade indirecta




Admirável nome do mundo jornalístico e comunicativo denota que já se corrompeu nas teias do negócio televisivo.
A sua frontalidade e humildade contrastavam com a sua sede de audiências. O seu espírito crítico e realista contrastava com a busca pelo sensacionalismo.
Homem de poucas habilitações académicas, experimentou de tudo um pouco e nunca disse que não ao que a vida lhe apresentava.
Jornalista, director de informação, pivô televisivo, hoje apresenta-se também como escritor. Disse não ter tido dificuldades em se desligar de uma escrita mais objectiva típica do jornalismo e passar para uma escrita mais romanceada, o que requer um uso mais criativo e imaginativo da mente, mas em todo o caso, a pesquisa, algo necessário à criação deste livro, não é ela também uma base do jornalismo? Não estarão a escrita jornalística e a escrita deste romance interligadas?
Júlio Magalhães profetizou declarações polémicas principalmente sobre qual o papel dos média perante a sociedade, o seu dever formativo e educativo e o seu poder social. Apesar do jornalista concordar com o poder e dever educativo e social dos média, este não consegue desligar do combate e busca diários pelas audiências seja a que preço for. A qualidade já não é um requisito nos meios de comunicação, estando cada vez mais o sensacionalismo, o ridículo e o brejeiro a ganhar terreno. Tudo em nome de mais share e nunca em nome da verdadeira informação.
Tentam-se encontrar desculpas e mais desculpas para a má qualidade informativa e educativa, pelo menos foi essa a sensação com que fiquei quando tive oportunidade de lhe colocar algumas questões que me pareciam pertinentes.
Tentei ser simpática sem o ser demasiado, interpelar as respostas. O objectivo era que as suas respostas saíssem do momento, do sentimento e não parecessem pré-feitas. Os nervos eram imensos mas a todo o custo tentei parecer relaxada e confiante. Os seus olhos e presença imponentes faziam-me recear a sua resposta e ao mesmo tempo davam-me uma curiosidade incompreensível. Em contraste a sua humildade e simpatia faziam-me sentir um estranho à vontade e instigavam-me a coragem para colocar em palavras o que pensava.
Uma tarde memorável, com várias surpresas e revelações, sem dúvida, intrigantes assim como intrigante o é Júlio Magalhães.
Lúcia Baptista (EFA G.S.A)