sexta-feira, 31 de julho de 2009

Histórias de Vida

Razões profissionais obrigam-me a participar em inúmeros seminários, conferências apresentando oradores mais ou menos conhecidos, individualidades relevantes e sobretudo profissionais das Empresas que apresentam testemunhos, experiências e as suas práticas mais exemplares. São sempre momentos importantes não tanto pelo seu lado mais simbólico e expositivo, mas sobretudo pelo espaço de partilha que propiciam – partilha de experiências, o encontro de visões plurais e de caminhos diversos.
Em boa hora, a AEP no âmbito das suas responsabilidades de promotor de Cursos de Educação e Formação de Adultos convidou o jornalista Júlio Magalhães. Num auditório pleno de atenção, meia dúzia de turmas EFA, ouviram com “atenção interessada” o Homem, o jornalista, o cidadão, o escritor que lhes transmitiu memórias de vida, recordações e vivências marcantes, experiências profissionais decisivas, ilusões e desilusões de uma personalidade cativante, comunicativa, e com uma enorme sensibilidade.
Com uma simplicidade notável Júlio Magalhães alertou consciências, levantou interrogações, percorreu momentos fundadores da sua vida, despertando emoções e recordações numa plateia fascinadamente atenta.
Por razões de natureza pessoal não posso deixar de referir um lugar para o qual Júlio Magalhães habilmente nos transportou.
Refiro-me ao apelo de África – de uma África que já foi e já não é, de uma Angola natal lhe imprimiu algumas das suas memórias mais intensas. Revisitei a minha condição já longínqua de retornado, relembrando com ele pedaços de histórias que se viveram então e que são hoje memória. Fomos transportados com Júlio Magalhães a essa África intensa que nos preenche, que só sente quem já lá esteve e pressente quem lá não esteve.
As memórias que Júlio Magalhães connosco partilhou (de resto como no livro “Os Retornados”) são memórias que transportam a alegria dos bons tempos, de juventude bem vivida, mas também da capacidade de integração na metrópole que “nem a Coca-Cola conhecia”, e de uma experiência de vida feita de acasos felizes associados numa grande persistência e enorme criatividade. Júlio Magalhães tem a arte de nos apresentar uma vida simples mas repleta de histórias divertidas com um enorme sentido comunicativo e sensibilidade.

Por isso estou certo que cada adulto presente naquele auditório, se reviu aqui e ali na notável história de vida de Júlio Magalhães, e com ele reflectiu uns em silêncio e outros através dos testemunhos vertidos neste blogue.


De Djelimady Tounkara - um músico fundador do Blues da África Ocidental, uma música extraordinária: Fanta Bourama.


http://www.youtube.com/watch?v=4E2aaQHcXHw&feature=related

António Pêgo


quinta-feira, 16 de julho de 2009

Os retornados

Tantos anos já passados
Desde que os retornados
Aqui vieram parar.
Mil vidas despedaçadas
Ainda hoje choradas.
Lembranças a recordarem
É assim anualmente.
Quando toda a gente
Procura juntar-se
É o matar de saudades
É o falar de verdades
Que ninguém pode abafar.
É juntar amigos
Recordar perigos
Dos tempos de além-mar
Aqui reina a alegria
Até ao final do dia
Na hora de regressar
Mais um ano afastado
É com os olhos molhados
Que prometemos voltar



HELENA ALMEIDA (EFA G.S.A)



http://www.youtube.com/watch?v=N0II75gCW-c

Reflexões sobre conversa com Júlio Magalhães...




É bom por vezes ter momentos de evasão da realidade dura que nos é mostrada, por exemplo através da televisão. Com a palestra gentilmente feita pelo Júlio Magalhães tive uma visão ainda mais realista, ainda que seja uma visão segundo os seus olhos. É uma realidade muito severa.


Os meios de comunicação não são mais do que “máquinas” a trabalhar no interesse dos grandes grupos económicos, que têm um único objectivo: OS NÚMEROS, O LUCRO, O DINHEIRO. Nem que tudo isto passe pelo choque de certas imagens, notícias em horário estratégico ou simplesmente pela manipulação em relação às crianças, que vai desde os brinquedos aos hábitos alimentares. O próprio jornalista descreveu isso com a simplicidade de quem lá trabalha, sem conseguir “despir a camisola” da empresa que representa. Conseguiu transmitir o verdadeiro stress em que vivem os profissionais da “caixinha mágica” para manipular as marionetas que somos todos nós nas mãos deles. Com muita naturalidade assumiu que noutros países se tivessem de descer as audiências, eles em tempo real alteram a grelha sem aviso prévio e o “burro come a palha que lhe dão”. É triste sermos tidos nesta conta. Se não dermos lucro, não temos opinião. Se não gostarmos de programas “de massa”, que chamam audiências, não temos direito a ver em horário nobre. Mas com tantos anos de trabalho na área é natural que fale desta forma. É a realidade do seu ambiente de trabalho e para o que é pago, provavelmente muito bem pago.


Também achei interessante o facto de Júlio Magalhães ter necessidade de ter actividades extra, sem terem nada em comum com a sua profissão, como jogar basquetebol ou escrever. Penso que é muito útil termos algo que gostemos de fazer para enveredarmos por aí quando abandonarmos a nossa profissão, para não nos sentirmos inválidos ou desorientados por nos faltar a rotina a que estamos presos. Outro ponto que achei muito interessante das suas palavras foi o facto de ele ter reconhecido que na vida foi um privilegiado. Soube aproveitar as oportunidades que a vida lhe deu. É um lema meu também, aproveitar as oportunidades na vida. Dizem que nada é por acaso, não sei se é ou não, mas por via das dúvidas aproveito sempre. Assim não me posso arrepender de lutar para conseguir uma vida melhor. Ele conseguiu, sem sequer ter concluído nenhuma licenciatura, não quer dizer que hoje em dia a realidade seja assim. No entanto, esta Nova Oportunidade vai ser a chave para um futuro melhor, disso tenho a certeza. Não sei se conseguirei ter o sucesso de Júlio Magalhães, mas hei-de ter sucesso na minha área com certeza. Isso posso dizer, pois depende de mim, e o que depende mim eu sou suficientemente exigente comigo própria para querer apenas o melhor!



Liliana Fonseca (EFA G.S.A)

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Júlio Magalhães - A frontalidade indirecta




Admirável nome do mundo jornalístico e comunicativo denota que já se corrompeu nas teias do negócio televisivo.
A sua frontalidade e humildade contrastavam com a sua sede de audiências. O seu espírito crítico e realista contrastava com a busca pelo sensacionalismo.
Homem de poucas habilitações académicas, experimentou de tudo um pouco e nunca disse que não ao que a vida lhe apresentava.
Jornalista, director de informação, pivô televisivo, hoje apresenta-se também como escritor. Disse não ter tido dificuldades em se desligar de uma escrita mais objectiva típica do jornalismo e passar para uma escrita mais romanceada, o que requer um uso mais criativo e imaginativo da mente, mas em todo o caso, a pesquisa, algo necessário à criação deste livro, não é ela também uma base do jornalismo? Não estarão a escrita jornalística e a escrita deste romance interligadas?
Júlio Magalhães profetizou declarações polémicas principalmente sobre qual o papel dos média perante a sociedade, o seu dever formativo e educativo e o seu poder social. Apesar do jornalista concordar com o poder e dever educativo e social dos média, este não consegue desligar do combate e busca diários pelas audiências seja a que preço for. A qualidade já não é um requisito nos meios de comunicação, estando cada vez mais o sensacionalismo, o ridículo e o brejeiro a ganhar terreno. Tudo em nome de mais share e nunca em nome da verdadeira informação.
Tentam-se encontrar desculpas e mais desculpas para a má qualidade informativa e educativa, pelo menos foi essa a sensação com que fiquei quando tive oportunidade de lhe colocar algumas questões que me pareciam pertinentes.
Tentei ser simpática sem o ser demasiado, interpelar as respostas. O objectivo era que as suas respostas saíssem do momento, do sentimento e não parecessem pré-feitas. Os nervos eram imensos mas a todo o custo tentei parecer relaxada e confiante. Os seus olhos e presença imponentes faziam-me recear a sua resposta e ao mesmo tempo davam-me uma curiosidade incompreensível. Em contraste a sua humildade e simpatia faziam-me sentir um estranho à vontade e instigavam-me a coragem para colocar em palavras o que pensava.
Uma tarde memorável, com várias surpresas e revelações, sem dúvida, intrigantes assim como intrigante o é Júlio Magalhães.
Lúcia Baptista (EFA G.S.A)

Uma conversa nunca se esquece









“(…)Não me venhas com disparates se tens ou não vocação de jornalista. É melhor que te perguntes se és curioso, impertinente, se te interessa o que te rodeia, se queres averiguar o porquê das coisas (…) uma das principais condições é a curiosidade (…) implica uma certa ingenuidade de espírito, um amor ao novo, um estar disposto a deixar-se surpreender cada manhã (…) O bom dos jornalistas, dos jornalistas assim sem mais nada, é que se interessam por tudo, se entusiasmam por tudo e para tudo (…) O que nos interessa é contar histórias. (…)”
In “Cartas a um jovem jornalista”, de Juan Luis Cébrian



14.45.
A tarde azulada e soalheira aquecia o nervosismo da espera.
Um esbracejar frenético do segurança revelou-nos a presença do convidado. Ao longe, por detrás das vidraças, uma silhueta elegante, de fato escuro esvoaçante a contrastar com a cor nívea da camisa, avançava a passos largos em direcção ao edifício frio, de linhas geométricas. Um calor humano invulgar invadiu os aposentos habitualmente objectivos e cinzentos.
O convidado tinha vindo de Lisboa. O atraso. Não almoçara. Um bolo e um café engolidos num ápice ajudaram à inspiração para a conversa. Teria, decerto, espantado o pessoal do bar se tivesse pedido o saudoso ovo estrelado com açúcar de que tanto falam aqueles cujas vivências em África pululam constantemente na memória.

Desde a infância, à minha volta, vozes saudosas de ovos estrelados com açúcar; de pão a transbordar de açúcar; da muamba de galinha acompanhada com o delicioso funge, vulgo “cola de sapato”; dos machimbombos de Luanda; das praias de águas tépidas, recheadas de alforrecas, que provocavam choques pelo corpo aquando de mergulhos vigorosos pelos jovens de então; do edifício em Luanda onde no topo brilhava a publicidade à tão famosa cerveja angolana “Cuca”; da capela do Grafanil, gravada num tronco de um embondeiro; do calor húmido tropical que incitava a banhos constantes; dos armazéns Chiadinho, pertencentes a homens da família…

Um brilho refulgente no olhar da audiência pousava na figura mediática que ia narrando vivências e histórias que lhe foram marcando o trilho da vida. A voz grave, entusiasmada, salpicada por alguns ingredientes humorísticos, saltitava por entre os ouvintes extasiados com a frontalidade e simplicidade do convidado.
Ávidos de respostas às suas questões, os presentes bombardearam sofregamente o jornalista, sempre de sorriso aberto e olhar de um verde sereno, irresoluto. Olhares grávidos de ideias, de incentivo; corações a transbordar de força para caminhar, agora, de cabeça erguida, tentando sempre agitar um pouco mais a vida, alcançando o equilíbrio estipulado por cada um.

Instigou-se à actividade e não ao conformismo passivo do sofá, absorvendo toda a informação sem qualquer postura crítica. Pairava no ar a ideia de que para se conseguirem alcançar os objectivos era necessária uma caldeirada de ingredientes que nem todos continham dentro de si mas que tinham de urgentemente buscar.

“Carpe Diem”! Um rasto deste perfume foi lançado no ar. A mensagem do viver a vida intensamente, sofregamente, como se de um último dia se tratasse, procurando sempre alcançar o equilíbrio convivendo, amando, trabalhando, lendo, praticando desporto, escrevendo… vivendo com garra!


Teresa Garcia


http://www.youtube.com/watch?v=S8JdYfaUBZo